“Para sobreviver, o PT tem de ouvir a sociedade, ao invés de tentar impor ideias, valores e conveniências”
O balanço das eleições municipais deste ano não foi bom para o Partido dos Trabalhadores.
O PT só conseguiu eleger prefeitos em 252 municípios (cerca de 5% do total) – apenas uma capital, Fortaleza -, muito pouco para uma legenda que pela sexta vez ocupa a presidência da República.
Como resultado, algumas de suas principais lideranças não se contiveram e saíram a público externando as suas divergências.
Impõe-se uma reciclagem na forma de os petistas fazerem política, ainda mais pela possibilidade de o presidente Lula, sua maior liderança desde a fundação do partido e hoje com 79 anos de idade, não quiser encarar a reeleição em 2026 – ele tem dito que só entra na disputa se as pesquisas lhe derem amplas chances de vitória.
Nuno Vasconcellos avalia a situação:
“… Caso não consiga mudar a imagem atual, de um partido preso a valores e princípios que eram modernos em meados do século passado, e caso não consiga assumir um discurso adequado ao Século XXI, o PT tende a seguir o mesmo rumo do seu adversário histórico, o PSDB, e se tornar uma sombra cada vez mais pálida do que foi no passado. Para sobreviver, o partido precisa dar ouvidos à sociedade — ao invés de continuar tentando impor a ela suas ideias, seus valores e suas conveniências.
O PT precisa abandonar o compromisso com causas que têm gerado repulsa na sociedade — como a defesa do aborto, da liberação do consumo de drogas, das invasões de propriedades e das “saidinhas” de presos da cadeia durante os feriados. E, ao mesmo tempo, ocupar o espaço de um partido progressista, democrático e defensor dos direitos da sociedade.
O PT precisa compreender que a sociedade hoje não aceita mais a doutrinação baseada em dogmas antigos e que não aceitará abrir mão da liberdade que conquistou e que lhe permite discutir todo e qualquer assunto por meio das redes sociais. A sociedade não vai renunciar à liberdade que conquistou. A presidente nacional do partido, deputada Gleisi Hoffmann, no entanto, pensa diferente.
Tanto assim que, após o desempenho acanhado do partido nas urnas deste ano, defendeu a regulação das redes sociais como uma forma de garantir que a esquerda deixe de ser “massacrada” nas urnas. É isso mesmo. De acordo com Gleisi, o caminho para o partido reconquistar o prestígio e o apelo eleitoral perdido é a restrição da liberdade de expressão.
Partidos aliados
O que está em debate aqui é o ambiente partidário que cerca o presidente. A impressão que se tem é a de que o PT — que cresceu em torno da liderança e do prestígio que Lula, mas nunca conseguiu ser maior do que ele —, ao invés de ser a principal peça de apoio, acabou se convertendo numa fonte permanente de problemas para o presidente. Isso mesmo: o governo tem sido acusado de falhas que não foram cometidas pelo presidente, mas pelos aliados que se mantém presos ao passado.
Quem olhar o cenário com um mínimo de atenção notará que os “partidos aliados”, conquistados depois das eleições para integrar o ministério em troca da garantia de apoio ao governo nas votações no Congresso, têm causado menos dissabores ao presidente do que o próprio PT. Quer um exemplo? Vamos a ele.
No início deste ano, algumas pesquisas de opinião feitas com discrição detectaram que o apoio incondicional que Brasília vinha dando ao ditador venezuelano Nicolás Maduro vinha causando danos à popularidade de Lula e poderia comprometer o prestígio do presidente. A estratégia e o bom senso recomendavam que Lula se afastasse ou que assumisse uma posição mais crítica em relação a seu antigo aliado.
Pois bem. Em julho passado, quando o governo brasileiro ensaiava as primeiras críticas, ainda tímidas, à paródia eleitoral realizada na Venezuela, o PT resolveu se manifestar. Quando o ditador Maduro se declarou vencedor da simulação de pleito, contrariando todas as evidências de que tinha sofrido uma derrota humilhante, o governo se calou. E condicionou o reconhecimento à apresentação de atas que comprovassem o resultado.
Foi então que o partido resolveu se manifestar. E soltou uma nota em que não só reconhecia os resultados da farsa como também jogava nas costas da oposição a culpa pela situação deplorável do povo venezuelano. É apenas um exemplo do descompasso que tem marcado a atuação do partido e do governo. E que pode piorar caso o PT não assuma suas responsabilidades. O partido que depende mais de Lula do que Lula depende dele precisa fazer uma autocrítica profunda e passar a ajudar, ao invés de atrapalhar o governo.”
Fonte TNH1 C/ Flávio Gomes de Barros