Proposta apresentada por Rodrigo Pacheco ainda vai a plenário; se aprovada, vai à análise da Câmara. Texto é reação a julgamento no STF que pode descriminalizar porte de maconha.
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado aprovou, nesta quarta-feira (13), a proposta de emenda à Constituição (PEC) que criminaliza a posse e o porte de drogas ilícitas em qualquer quantidade. O texto foi aprovado em votação simbólica, sem contagem nominal de votos. A PEC segue para o plenário do Senado e, se aprovada, será enviada para a análise da Câmara.
Quatro senadores pediram para registrar voto contrário ao texto: Marcelo Castro (MDB-PI), Fabiano Contarato (PT-ES), Jaques Wagner (PT-BA) e Humberto Costa (PT-PE).
O tema também está sendo discutido pelo Supremo Tribunal Federal (STF): a Corte deve decidir se é crime uma pessoa portar maconha para consumo próprio. Iniciado em 2015, o julgamento foi retomado no último dia 6. Quando o placar estava com 5 votos favoráveis à descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e 3 votos contrários, o ministro Dias Toffoli pediu mais tempo para análise, e a análise foi adiada mais uma vez (sem data para voltar à pauta do STF).
A diferença entre o que está sendo discutido pelo STF e o que a CCJ aprovou é a seguinte:
O STF discute descriminalizar o porte de pequenas quantidades de maconha. Ainda não há maioria formada nesse sentido. Caso se decida pela descriminalização, os ministros ainda têm que definir quantos gramas seriam permitidos.
O texto da PEC aprovada nesta quarta na CCJ do Senado não especifica a que droga se refere – diferente do que está em análise no STF, que trata exclusivamente da maconha – mas fala em “drogas ilícitas”. Ao criminalizar até mesmo o porte de pequenas quantidades, a proposta prevê que o cidadão pego nessas condições seja punido com penas alternativas à prisão, que podem ser, por exemplo, medidas socioeducativas, e fique com a ficha criminal suja.
Quando o STF retomou o julgamento da descriminalização do porte de maconha, no ano passado, o Senado alegou que o tribunal estava legislando no lugar do Congresso. Já o STF diz que o Congresso se omite nesse tema. A PEC aprovada na CCJ é uma reação dos senadores ao julgamento no Supremo.
PEC apresentada pelo presidente do Senado
A PEC foi apresentada pelo presidente do Senado, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e tramitou na CCJ sob relatoria do senador Efraim Filho (União-PB).
No relatório aprovado pela CCJ nesta quarta, Efraim alterou o texto de Pacheco para incluir uma emenda do senador Rogério Marinho (PL-RN) que diferencia traficantes e usuários.
O trecho possibilita que o usuário seja punido com penas alternativas à prisão e encaminhado para tratamento contra a dependência química – mas não define qual quantidade de droga diferencia usuários e traficantes.
“Essa medida tem como finalidade manter a criminalização sem, contudo, afastar os usuários da busca por tratamento à saúde, além de distingui-los dos traficantes de drogas, para os quais a legislação já prevê a aplicação da pena privativa de liberdade”, escreveu Efraim no documento.
Com a aprovação do relatório na CCJ, a PEC pretende inserir no artigo 5º da Constituição o seguinte texto:
“A lei considerará crime a posse e o porte, independentemente da quantidade, de entorpecentes ou drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, observada a distinção entre o traficante e o usuário, por todas as circunstâncias fáticas do caso concreto, aplicáveis a este último penas alternativas à prisão e tratamento contra dependência”.
Debate na CCJ
Durante a sessão, Efraim criticou indiretamente o fato de o Supremo Tribunal Federal estar analisando uma ação sobre o mesmo tema – e ter decidido fixar, no julgamento, a quantidade máxima de porte para diferenciar o usuário e o traficante.
“[…] Foi decidido e deliberado na reunião de líderes que era um posicionamento que precisava ficar muito forte, né? O foro adequado para que se trate situações dessa natureza que poderá ou não levar a discriminalização da droga no Brasil. O foro adequado é o parlamento, é aqui onde estão as pessoas que foram eleitas e escolhidas pela população para representá-las em situações dessa natureza”, afirmou.
“O parecer vai nesse sentido e o parecer reforça duas posições para manter a posição contrária a essa descriminalização. Primeiro, o pilar da saúde pública, segundo o pilar da segurança pública”, disse.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES), em seguida, defendeu a posição do STF e criticou a PEC em votação.
“Eu fui delegado de polícia por 27 anos e essa PEC não inova em absolutamente nada. Sabe por quê? Nós temos uma população carcerária no Brasil, dados, ela saltou de 58,4% para 68,2% de pessoas pretas, de pessoas pardas. Nós temos aqui que um branco no Brasil, para ser definido como traficante, ele tem que ter 80% de substância a mais que um negro. É o Estado criminalizando a pobreza, criminalizando a cor da pele”, disse.
Lei de Drogas
A Lei de Drogas, de 2006, estabelece, em seu artigo 28, que é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal.
No entanto, a legislação não fixa uma pena de prisão para a conduta, mas sim sanções como advertência, prestação de serviços à comunidade e aplicação de medidas educativas (essas duas últimas pelo prazo máximo de cinco meses).
Dessa forma, a lei despenaliza o porte de drogas para consumo próprio, mas também não legaliza a conduta. Se aprovada, a mudança na Constituição proposta na PEC irá classificar a conduta como crime.
Julgamento no STF
O STF e o Congresso abordam o mesmo tema nos limites das competências de cada um, definidas pela Constituição.
A Corte foi provocada a se manifestar a partir de um recurso que chegou ao tribunal em 2011, que discute se é crime uma pessoa ter consigo uma quantidade de entorpecente destinada ao consumo individual.
O caso envolve a prisão em flagrante de um homem que portava 3 gramas de maconha dentro do centro de detenção provisória de Diadema (SP).
A Defensoria Pública questionou decisão da Justiça de São Paulo, que manteve o homem preso. Entre outros pontos, a defensoria diz que a criminalização do porte individual fere o direito à liberdade e à privacidade.
Esses direitos fundamentais estão previstos na Constituição. Como a matéria envolve a Constituição, cabe ao Supremo se pronunciar.