Ronaldo Lessa ‘detona’ gestão do governo Renan Filho e articula candidatura

A escolha do futuro prefeito da capital alagoana passa, essencialmente, pela definição de nomes para a disputa eleitoral. Dezenas de especulações existem em torno do processo, porém, nenhum deles tem a experiência do ex-vereador, ex-prefeito, ex-deputado estadual, ex-governador e ex-deputado federal Ronaldo Lessa (PDT).

Disposto a dialogar com partidos de centro-esquerda, do campo progressista, ele detonou o segundo mandato do governador Renan Filho (MDB), a quem acusa de não priorizar os mais pobres com recursos do Fundo Estadual de Combate e Erradicação da Pobreza (Fecoep). Por isso, vai liderar em oposição ao governo.

Lessa não fala em “traição”, mas reconhece estar decepcionado com o fato de ter ajudado o governo em seu primeiro mandato, atuando como coordenador da bancada federal, na articulação política para a redução do pagamento dos juros da dívida, que caiu de 22% para 5,5%, inclusive com período de carência.

“Hoje ele paga 5,5% de juros e ainda teve carência, o que lhe proporcionou fazer um caixa de R$ 1 bilhão. Essa participação nossa foi importante naquele momento. Mas o segundo governo eu já não posso dizer a mesma coisa. O Renanzinho não está correspondendo. A prioridade dele é outra. Senti isso quando fui administrar uma pasta importante – a Secretaria de Agricultura – num estado que é essencialmente agrícola, pesca e com pecuária, e o cara não deu prioridade”, afirmou o ex-governador. “O desenvolvimento se dá quando se trabalha com harmonia, o grande o pequeno. Mas o Canal do Sertão está lá abandonado, sem projeto nem para o grande nem para o pequeno. Mesmo assim, não saí chutando o balde. Não cuspi no prato que comi”, reforçou.

Ele disse, ainda, que diverge da forma como o governo tem aplicado os recursos do Fecoep, que surgiu em seu governo e como foi aprovado pela Assembleia Legislativa Estadual (ALE), à época. Conforme lembrou, o dinheiro era para a erradicação da pobreza, e não, para muitas coisas que estão sendo feitas como obras de engenharia, em especial a construção de unidades hospitalares. “Para ele, a pobreza não é prioridade. Isso é sim um ponto divergente nosso”, apontou Lessa.

Compromisso

Do ponto de vista político, Ronaldo Lessa lembrou também que o governador não cumpriu com um acordo que foi construído na formação do “chapão”, que era o de viabilizar a saída de algum deputado para que ele se mantivesse em Brasília (DF), já que seu trabalho como deputado vinha sendo reconhecido.

“Isso aí não foi para mim. Não tinha um número específico e nem sabia que ia perder. Na hora da composição, ele [Renan] foi quem disse que eu deveria ficar lá, pois tinha sido coordenador da bancada por quatro anos e sempre eleito por unanimidade. Então faria um rodízio para que eu permanecesse. Isso era o compromisso antes da eleição. Não foi feito e eu aceitei. Havia a secretaria e não sei se ele fez isso para me perseguir. Se ele queria me destruir politicamente ou não, o problema é dele e está dentro do queria fazer. Agora, o que estava ocorrendo era evidentemente isso. O Programa do Leite, de sementes, questões com agricultura familiar, erradicação da pobreza, entre outros. Depois, como é que vou estar no governo com um terço de orçamento do que eu mandava quando era governador?”, questiona Ronaldo Lessa.

Diante de um contexto de bastidores tão conturbado, com acordos descumpridos, com falta de reconhecimento da atuação parlamentar, inclusive viabilizando politicamente e economicamente o governo, Ronaldo Lessa voltou a enfatizar. “Minha relação política com os Calheiros [senador Renan e o governador Renan Filho] acabou. Pra mim está encerrado. Temos pontos absolutamente divergentes e eu espero continuar minha carreira política com oposição ao governo”.

Por essa razão, não está descartada, por exemplo, a expulsão de Rafael Brito, atual secretário Estadual de Turismo, que vem sendo cogitado para o eventual cargo de vice numa composição apoiada pelo Palácio República dos Palmares. O assunto não é tratado como oficial no governo, porém, já chegou a ser especulado. Ele é casado com a sobrinha de Ronaldo Lessa e também é filiado ao PDT. Uma outra sobrinha, a jornalista Mariana Lessa, trabalha ao lado do governador Renan Filho e já teria sido alvo de algumas brincadeiras, em que o chefe do Executivo lhe teria indagado sobre de que lado ficaria, caso o tio saísse como candidato a prefeito.

“Não posso cobrar um posicionamento da família e submetê-la a um constrangimento desses. Mas, se ele convidou o Rafael para ser vice do Alfredo (Gaspar), até pode ser, mas terá que sair daqui. Trato isso sem nenhuma questão pessoal. Já houve aqui um pedido de expulsão dele, pelo Heth César, e não foi definido, mas tem um parecer contra porque, a época em que isso ocorreu, não havia uma obrigação de que todos entregassem o cargo. Mas, se insistirem nisso, ele vai ser candidato por outro partido”, revelou.

Experiência

Atualmente Lessa é o presidente do Diretório Estadual do PDT e vice-presidente da legenda na Região Nordeste. Além de discutir o processo eleitoral na capital, também articula o interior. Mesmo com a força que possui internamente e o poder de influência fora do partido, não quer fazer imposições sobre uma possível candidatura a prefeito.

Mesmo sem “bater o martelo” sobre o pleito, reconhece que, diante do cenário posto, com os nomes já apresentados, enquanto cada um vai ter que dizer “o que vai fazer”, sabe que terá a confortável situação de dizer “que já fez” e saiu sem máculas em sua trajetória como gestor. Quanto a isso, ele lembra os concursos públicos que organizou, investimentos em Educação, Infraestrutura e do quanto contribuiu para a mudança da imagem nacional de Alagoas.

“O maior capital político meu é exatamente esse. Fui vereador, deputado estadual, prefeito, governador e deputado federal. Então isso é o que é a diferença. Enquanto os outros vão dizer que irão fazer, eu já fiz muita coisa, como a reorganização do Estado, os concursos, a infraestrutura do turismo, que explode agora, com a ampliação do Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares, a construção do Centro de Convenções e até a retirada da Ceasa do Centro de Maceió. Mudamos a imagem do Estado marcado pela violência. A PM nossa recebeu o prêmio nacional de Direitos Humanos, antes era chamada de ‘gangue fardada’. Essa mudança de qualidade com a cultura que nós incentivamos, com a criação da primeira secretaria do Brasil de políticas para a mulher e que hoje é uma exigência, à época fomos vanguarda. Além disso, criamos o Centro de Gerenciamento de Crises, que é referência para todo o Brasil. Todo o País copia daqui”, relembrou Lessa.

Mesmo destacando isso, ele compreende que o momento político cria novas necessidades que precisam ser incorporadas numa eventual candidatura. Sendo assim, tem se debruçado sobre a nova conjuntura e, principalmente, as novas expectativas geradas pelas pessoas em sua diversidade.

“Não posso esconder que, de todos os mandatos que exerci, o que me deu mais prazer foi ser prefeito, porque você fica mais próximo das pessoas, buscando soluções imediatas. Então, fui para Brasília, depois na secretaria e não deu certo, aí veio o Carlos Lupi e me provoca. Meu plano era ficar como deputado e ajudar os companheiros. Aí veio uma discussão no partido e a Kátia (Born) e o Judson (Cabral) me deram todo o apoio, só o Corintho (Campelo) que mantém o seu nome como candidato”, detalhou Ronaldo.

Alianças

Enquanto a situação não se define internamente, o PDT se articula como pode a partir da orientação do Diretório Nacional. Isso não o impediu, por exemplo, aqui em Alagoas, de dar os primeiros passos para a formação de frentes e busca de apoio político.

Um dos contatos mantidos por aqui foi com a ex-senadora, ex-vice-prefeita e ex-vereadora Heloísa Helena, da Rede. “Estamos mais juntos do que antes”. Os dois, segundo Lessa, já mantiveram, inclusive, mais de um contato que serviram para analisar a conjuntura nacional, bem como as condições para alianças baseadas na realidade local. Ele não deixou claro se a convidou para ser sua vice, numa eventual chapa, porém, adiantou que ela estaria disposta a participar do que chamou de “bloco” partidário e, até mesmo, de uma chapa. Mas a própria Heloísa teria sugerido que ele ampliasse a base de apoio.

“Na tese geral, o PDT vai procurar ficar nesse campo (progressista) com partidos como PSOL, Rede, PSB e PV. Aqui é claro que vou respeitar. Se eu puder estar no interior com esses partidos eu ainda amplio muito mais. O pessoal desses partidos me trata muito bem. Minha relação com a Heloísa é a melhor possível e também o Cidadania. Estive com o PC do B e conversei com o Cícero Filho. Sei que é pré-candidato e fui até para o lançamento da pré-candidatura do Ricardinho pelo Avante. Para mim, democracia é isso. E fortalecer esse campo é algo importante”, ponderou Ronaldo Lessa.

Quanto a Maceió, em especial a aliança com o PSB seria cercada de muitos detalhes. O primeiro deles é o fato de que o principal candidato, João Henrique Caldas (JHC), já lançou sua candidatura com base em pesquisas, e o indicam como um nome forte também para a disputa. Entretanto, a mesma consulta, ainda não oficial, aponta o próprio Ronaldo Lessa como segundo colocado. “Juntar duas peças que estão desse jeito ninguém vai querer ser o vice, não é verdade?”, disse.

Segundo Ronaldo, ele pessoalmente já tomou uma posição e vai propor à direção do partido que é quanto à oposição ao governo. Entretanto, acabou reconhecendo que isso não é algo “imutável”, tanto que citou o exemplo do quadro político em Penedo. Lá, o nome apoiado pelo governo do Estado é o vice-prefeito Ronaldo Lopes, do MDB, que também terá o seu apoio.

Demonstrando maturidade política, Ronaldo chegou inclusive a analisar que, no primeiro turno da eleição, é “impossível” existirem tantos candidatos. Sendo assim, acredita que, “para chegar a um segundo turno”, precisa ampliar as alianças “mais ao centro”.

“Não queremos construir uma frente só de esquerda. A tese é que a gente possa construir uma frente mais ampla, com independência total para termos nossos aliados, porque, no momento, há duas grandes lideranças, que é o governador, e, do outro, o prefeito de Maceió. São os dois pontos fortes. No caso da prefeitura, não tenho tido restrições, mas o prefeito tem seus problemas”, acrescentou Ronaldo, citando o conflito interno do PSDB.

Conflito

Estratégico, pois sabe que, ao mesmo tempo em que rompeu com o governo e não faz críticas à gestão de Rui Palmeira (PSDB), pode também estar abrindo um espaço de conversa. Tanto que acabou lembrando que, mesmo o PDT tendo ido apoiar o MDB em 2018, “não fechou as portas” para a prefeitura.

Outro detalhe que fez questão de destacar é que “nunca discutiu com Palmeira” e que mantém uma relação que considera “muito boa”. Ao invés disso, diz que sempre preferiu dizer o melhor, como o fato de “nunca ter conseguido fazer um Natal como ele fez”. Por outro lado “fiz uma orla na Lagoa Mundaú” que, agora em sua avaliação, está destruída. Ainda assim, acabou identificando, no senador Rodrigo Cunha (PSDB) e atual presidente da legenda, uma força política que pode ser apoiada pelo prefeito e ser lançado como um nome para a disputa.

Do outro lado, no caso da existência de uma candidatura do procurador-geral de Justiça, Alfredo Gaspar de Mendonça, ainda sem partido, mas “cortejado” pelo Palácio dos Martírios, Ronaldo não acredita que ele pode ser um nome para “unir”, tanto o grupo de Rui com o de Renan. “Não acho isso possível. Para mim uma coisa é uma coisa outra coisa é outra coisa”.

Quanto à informação de que a próxima vaga para o Tribunal de Justiça é do Ministério Público, ele preferiu não especular se Alfredo irá ou não abrir mão de mais 15 anos de atividades ligadas ao Judiciário, em detrimento de um projeto político. “Não tenho um convívio particular com o Alfredo (Gaspar) para conhecer sua cabeça. Mas lógico que colocar o nome à disposição tem que se construir e se doar. Acho que a razão, seja qual for, de vir a ser candidato é para mudar de eixo. Sai do MP e vai para outro. Mas existe a possibilidade de ele ser convocado como o (Sérgio) Moro foi. Mas isso eu não posso responder porque nunca conversei com ele. Não o vejo como o nome mais forte do processo. No momento, teoricamente, é o JHC. Agora, se ele tende a subir, eu não sei. Pelo menos na pesquisa. Mas também não podemos atestar porque já vimos, desde a última eleição, que muitas delas são fabricadas ou feitas para alguns interesses”, analisou Ronaldo.

Gestão

Como o foco principal é a gestão municipal, Ronaldo acabou lembrando que a situação dos prefeitos em todo o País, em especial das cidades com pouca arrecadação, é complicada. Por isso evita fazer críticas pontuais à gestão municipal, ou de outras grandes cidades alagoanas, porque a questão está na queda do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

De acordo com Ronaldo, a realidade municipal de sua época de prefeito é bem diferente da atual; como exemplo lembra que a população cresceu muito. Até porque, conforme lembrou, a Constituição de 1988 criou responsabilidades para as cidades, mas “cada vez mais concentra os recursos e míngua o repasse”. “Ao mesmo tempo que tira dinheiro obriga que toda a Educação, desde a primeira infância até os seis anos, seja responsabilidade do Município, assim como a Saúde básica. Ou seja, deu responsabilidade e não dá financiamentos”, afirmou Ronaldo.

Ele lembrou que viveu um pouco essa realidade quando era governador e discutia essas questões com o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A questão ficou pública quando, na inauguração do Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares, declarou, em seu discurso, que o “Governo Federal dava com uma mão e tirava com a outra”.

“A época falei com o Lula e disse que não tinha como e até teria tentado falar com o ministro (Antônio) Palocci. Na época eu pagava 22% de juros da dívida com a União. Isso era quase 1/4 de toda a arrecadação do Estado. Nem os governos de direita faziam aquilo. E eu tinha que defender Alagoas. Tanto que o Lula me orientou a ir para a Justiça e, depois, caiu para 15% graças ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa. Na época em que paguei ao governo era mais o menos o preço do aeroporto. Ou seja, o que ele recebeu ele devolveu”, observou Ronaldo.

Embaraço

Quanto às dificuldades dos partidos mais tradicionais em se articular, Ronaldo lembrou que cada um tem seus embaraços a serem resolvidos. Se, ao mesmo tempo irá trabalhar pela união do PDT e pela construção de um caminho de união, reconhece que os demais também têm ajustes a serem feitos.

Um exemplo seria o próprio PSDB, que é governo, tem um senador, mas, ao mesmo tempo, encontra-se próximo ao PSB, de forma indireta. Isto porque a suplente do senador Rodrigo Cunha, Eudócia Caldas, é a mãe do já anunciado pré-candidato JHC. Ele, por sua vez, faz oposição à prefeitura e, até onde se sabe, também ao governo do Estado.

Para ele, isso justifica a “aposta” de Rui no Podemos, que é comandado por seu secretário de governo Tácio Melo. A relação política dos dois foi se ampliando ao passo em que foi havendo um distanciamento do chamado diálogo permanente com Cunha. Isso, na verdade, teria surgido desde a campanha para o governo, quando Rui se aproximou do então candidato do Pros, o senador Fernando Collor, que, posteriormente, desistiu da disputa.

“Tá na cara que existe esse embate. Não é à toa que o Rui está apostando no Podemos, que tem um homem de confiança dele. O Rui está trabalhando o seguinte: se esse caminho (de apoio do Rodrigo a JHC) for tomado, eu vou para outro lado. O quadro mais forte do PSDB é o Rodrigo, que teve mais votos que o JHC. Mas, e se ele não vai? Talvez seja uma estratégia do próprio partido que não quer perder um senador. O fato é que ele não vai, mas estaria fortalecendo, ou pelo menos se especula isso, que o JHC tem o apoio do Rodrigo. Se isso acontecer ele lança um outro candidato pelo Podemos, ou até mesmo, um outro partido, o DEM. Ele (Rui) também tem o PP, mas esse está com o deputado Davi (Davino)”, especulou Ronaldo.

Nesse contexto, Ronaldo não descarta a possibilidade de que, caso essa articulação de Rui não avance, ele possa apoiar uma candidatura “de fora” de seu campo de alianças, como a sua para a prefeitura. “Isso é uma questão. Se vai ou não ter, não sei porque não foi algo projetado”, acredita.

Para finalizar, o presidente do PDT acabou revelando que terá que adotar estratégias diferenciadas de outras campanhas quando “corria” os quatro cantos do Estado. No momento, o melhor seria priorizar áreas importantes da capital, mas lançando mão da tecnologia, como as redes sociais, para conseguir se comunicar.

“Eles têm mais pernas para subir e descer com mais tranquilidade. O que eu quero é que eu possa compensar isso com a minha experiência, com a tecnologia com outras formas. Eu não vou poder fazer a cobertura de quatro ou cinco bairros num dia. Tem que ter um outro mecanismo. Depois das redes sociais há um outro mecanismo de trabalho com o qual tem muita coisa positiva e muita negativa. Mas eu espero que o que eu tenho de acúmulo que a vida me deu, com o que o povo me deu para ocupar todos esses cargos, que isso seja uma forma de compensar a falta de juventude. Agora, não significa dizer que juventude representa o novo. Essa é que é a grande diferença. Juventude é uma coisa e sabedoria é outra”, concluiu Ronaldo, falando como candidato.

gazetaweb

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